Lenda. Falar de Sebastião Elói e de Padre Caprazio é falar de duas. Viveram em Patrocínio numa mesma época. Amaram Patrocínio como ninguém. Ambos patrocinenses, um nativo, outro adotivo. Praticamente, a mesma idade. Faleceram na cidade em um mesmo dia de fevereiro. Um em 1997, o outro em 2004, sete anos depois. Um, mestre com a caneta, o outro mestre do saber e da fé. Um, vinte anos sem ele. O outro, treze anos. A saudade e suas lições deixadas os fazem retornar sempre ao convívio dos rangelianos.
HÁ VINTE ANOS... ESCREVÍAMOS NO JP – Escrever o quê, se ele escreveu de tudo para nós. Falar o quê, diante daquilo que ele sempre nos falou. Despedir porquê, se ele continua vivo. Chorar não é preciso. Sua obra, sua simplicidade, é maior do que qualquer dor. E sua amizade, uma dádiva, que só o coração sabe o valor.
O MESTRE – Somos privilegiados. Ainda em janeiro de 1997, poucos dias antes de sua morte, na Santa Casa, conversamos sobre a nossa Patrocínio e rimos de alguns personagens que, no teatro da vida, vivem em trapalhadas. Durante décadas, ouvimos a história patrocinense contada por ele. Tão somente o maior contador, o mais sábio, da história de Patrocínio. Por isso, conhecemos alguma coisa a respeito. Mas será muito difícil surgir alguém para ocupar o seu espaço.
QUEM É ELE – Nossos jovens leitores talvez não saibam tanto. O Sebastião Elói dos Santos não foi apenas jornalista e criador da Gazeta. Sem consultas, escrevendo de improviso, citamos alguns de seus passos. Cofundador da Rádio Difusora, poeta, historiador, escritor, maçom, cofundador do Aéreo Clube (anos 40), membro e fundador da Academia Patrocinense de Letras, jornalista em Patos de Minas, diretor do Ipiranga E.C (anos 40) e vereador por dois mandatos. Afinal, foi Tião Elói do princípio ao fim. Participou dos eventos mais importantes de Patrocínio, alegres e tristes, nas décadas de 20, 30, 40, 50, 60, 70 e 80.
NASCIMENTO – 7 de agosto de 1906, na então Rua Governador Valadares, em Patrocínio.
FALECIMENTO – 12 de fevereiro de 1997, às 10h30min, em Patrocínio.
APOTEOSE – No dia 13 de fevereiro de 1997, pela manhã, o seu corpo se uniu de vez à terra que tanto amou. A terra mel-rangeliana. União perfeita.
TRISTE DATA – Quinta-feira, 12 de fevereiro de 2004. Outro grande mestre partiu. À terra que tanto amou, se juntou para a eternidade. No retrovisor de sua sagrada caminhada ficaram lição de vida, fé, moral e bondade. Noventa e sete anos de amor.
O COMEÇO – Bernardus Jonhannes Marie Franken nasceu em 3 de março de 1907. Na Holanda, em Amsterdã. Cursou Teologia e Filosofia. Aos 28 anos de idade, já como padre Caprazio, da Congregação dos Sagrados Corações, chegou ao Brasil. Permaneceu no Rio de Janeiro por três anos em atividades pastorais. Em 1938, veio para Patrocínio. Exatamente, para o poderoso Ginásio Dom Lustosa, criado pela irmandade (padres Gil, Matias e Eustáquio) em 1927.
EDUCAÇÃO – No Dom Lustosa se tornou o melhor professor de Química de sua história. Há quem diga da região. Também lecionou Física, Religião e Ciências. No seu curriculum cursos na Holanda e estágio com o Prêmio Nobel de Microquímica, Prof. Fritz Feigl, da Universidade de Viena, no Rio, em 1944. Foi professor também no Colégio N. S. do Patrocínio, Colégio Olímpio dos Santos e Escola Agrícola.
SUA AMADA TERRA – Viveu em Patrocínio por 65 anos. Com interrupção nos anos 40, quando esteve na então capital da República, Rio de Janeiro. E nos anos 50, ocasião que tentaram transferi-lo para Araguari. Nessa oportunidade, declarou o seu amor incondicional à cidade de Patrocínio. E não foi transferido pela congregação.
PAIXÃO – Da década de 50 à década de 90 foi o capelão da Igreja São Francisco. Comunidade pela qual tinha adoração paternal.
CENAS INESQUECÍVEIS – O laboratório do padre Caprazio no Dom Lustosa. O seu pequeno caminhão nos anos dourados. A bicicleta. Os sinais de direção com as mãos ao pedalar pelas ruas da urbe. As “provinhas” (teste surpresa para avaliar o estudo do aluno, que valia ponto). A interpretação do comportamento dos animais. Pequenas cobras (répteis) em suas mãos. A batina branca.
OBRIGADO – Patrocínio tem eterna gratidão ao mais patrocinense de todos os holandeses, de todos os europeus, em todos os tempos. Dele, diversas gerações receberam formação acadêmica e de caráter. De concessão e alegria.
DESPEDIDA – Em 2003, um pouco antes de sua morte, estivemos visitando-o na Casa Paroquial Padre Damião de Molokai. Outro privilégio para nós. No final, após sua benção, disse-nos: “Rezem comigo (de mãos dadas). Pai Nosso, que estais no Céu; santificado seja o seu nome...”
Primeira Coluna publicada na Gazeta, edição de 11/2/2017.