Tempo. Ele inexoravelmente passa. Para todos e para tudo. Mas, ficam os fatos históricos. Patrocínio, no começo do século XX (século passado), possui alguns fatos ignorados na atualidade. A invasão de 1912 é um deles. Alemanha fez análise química de águas minerais de Serra Negra e Salitre é outro fato pouco conhecido. Com a ajuda do jornal “Cidade de Patrocínio” é possível visitar o Município entre 1911 e 1916. Lá se vão mais de 110 anos...
REVOLTA CONTRA IMPOSTOS MUNICIPAIS – Dia 5 de dezembro de 1912, chegou à cidade grande número de homens armados (possivelmente das fazendas e distritos). Visavam atacar à Câmara Municipal e à Coletoria (agência coletora de impostos). O pensamento era queimar todos os arquivos e depor (cassar) os vereadores. Isso se não fossem atendidas as suas reclamações sobre os impostos municipais. Patrocínio estava em estado de guerra.
SEM TIROS, MAS COM CONVERSAS... – Os boatos foram maiores do que a presença inesperada de mais de 200 homens no centro da cidade. O líder do grupo insatisfeito, segundo o jornal, era amigo dos dirigentes do partido político do Coronel Honorato Borges. O ordeiro comandante dos revoltosos (seria Elmiro Nascimento?) disse: “Nada farei sem primeiro ouvir o Cel. Honorato”. Como o Cel. Honorato não pode comparecer à reunião de convergência, o seu genro Nhonhô Paiva participou. O presidente da Câmara e agente executivo (prefeito) Arthur Botelho e Elmiro Alves do Nascimento foram os outros participantes. Com dignidade para as partes, os problemas foram equacionados. E a paz voltou a reinar em Patrocínio. A notícia completa também foi publicada pelo jornal “Estado de São Paulo”, em dez/1912.
ÁGUAS MINERAIS – Em julho de 1911, as fontes (minas, mananciais), localizadas em Serra Negra e Salitre já despertavam atenção. A fazenda da Serra Negra distante apenas 18 Km da cidade e a fazenda do Salitre, a um km do traçado, onde passaria a Estrada de Ferro de Goyaz (hoje Salitre). Laboratórios do Rio de Janeiro e de Hamburgo (Alemanha) analisaram as águas patrocinenses. Além da existência da água “sulfurosa gazosa”, a alcalina de Serra Negra continha muitos minerais (sulfato de sódio, “chlorureto de sódio”, ácido silícico, etc.). O alemão dr. C. Enock (Hamburgo) foi o responsável pelo processo de análise. “Como se vê pela análise, essas águas são de eficacíssima virtude medicinal”, informava o “Cidade de Patrocínio”. E passado mais de um século, os patrocinenses ainda não valorizaram o seu tesouro líquido.
PATROCÍNIO TINHA MUITA ÁRVORE – Crônica escrita pelo magistral professor Olympio Carlos dos Santos, no princípio do século XX, por volta de 1900-1910, mostrou a riqueza vegetal e verde do Município. Sob o título “Mattas de Patrocínio”, o mestre destacava abundância das florestas e matas no Município. Com o português casto, disse que seria impossível de enumerá-las todas, pois havia também inúmeras “ilhas” de matos. Destacou a “extensa matta dos Folhados”, numa extensão superior a 48km, que produz toda espécie de madeiras, inclusive aroeira, de duração secular. Outras mencionadas: “Matta do Salitre, Matta dos Catulés, Matta do Estreito e as Mattas de Macahubas de Baixo, Entre Rios, Quebra-Anzol, Santo Antônio, Fazenda dos Cocaes, Barreiro, Dourados e Esmeril”. Ele não se esqueceu também da mata da Serra Negra, Congonhas, Guariroba, Barra do Salitre (onde nasceu Milton Magalhães), Confins e Santo Ignacio. Olympio dos Santos afirmou que poucos municípios mineiros podiam contar com esse número de matas, além de muitos capões (matinhas) e matos. E que, ao lado das matas, existiam extensas campinas que “atestam a superioridade da criação que ahi pasta...”
E NA ATUALIDADE? – A Patrocínio de agora é o contraditório da Patrocínio descrita pelo prof. Olympio dos Santos. Poucas matas, poucas árvores, pouco verde, pouco interesse na preservação da natureza, é o cenário de hoje.
CORREIO A PÉ OU A CAVALO/BURRO – Vez por outra, havia reclamação contra a morosidade do estafeta (agente postal). A principal conexão do Correio era com Araxá. O estafeta recebia as malas postais na ponte do Rio Quebra-Anzol, “a 7 léguas (± 40 km) da cidade”. Na verdade, o estafeta, cansado, chegava à noite, muitas vezes a pé, devido ao péssimo estado dos animais. E para piorar, durante o período das chuvas, o estafeta era desprovido de agasalho para ele e para as malas, causando sérios danos às correspondências. O empresário que explorava o serviço de correio recebeu as queixas. Tudo isso em 1916. Esse tempo existiu...!
1914 JÁ TINHA CINEMA! – O Cinema Popular exibiu filmes como “Inauguração da Estátua de Barroso”, “Os Suspensórios”, “Presente de Noivado”, e “Ventiladores”. O filme (escrevia film) de maior destaque foi “Fortuna Passageira”, com 800 metros! Os “films” eram exibidos aos sábados e domingos. Com plena certeza, os filmes eram mudos, preto e branco, pouca visibilidade e nenhum ator famoso. Pois, não eram divulgados nomes de atores/atrizes. Esse fato da existência de cinema nessa época praticamente era e é desconhecido.
POR FIM – Patrocínio tem história. Tem o que falar. Sigamos...
*** Crônica também publicada na Gazeta de Patrocínio, edição de 28/01/2023.