Um texto/relíquia enviado pelo fraterno amigo Rondes Machado, para o "Menestrel Rangeliano"- Eustáquio Amaral, com cópia pra nós. Trata-se de um poema do fundador e primeiro presidente da Academia Patrocinense de Letras - APL, republicado em 25/05/2019 no Jornal de Patrocínio.
Dr. Michel Wadhy. Posso falar um pouquinho dele antes de postar o referido poema?
Nosso eterno “Homem de Branco”, além de médico, devotado aos menos favorecidos, era poeta, humanista, político, desportista, amigo sem igual da juventude. Eu aqui tinha a ousadia de procurá-lo em sua casa e até em seu consultório, para lhe mostrar meus escritos tosto. Ele lia e incentivava.Nunca existiu outro ilustre tão acessível aos jovens.
No poema abaixo, Dr. Michel relembra seus nove anos ( há 95 anos) quando era engraxate e esperava o final das missa para fazer o seu trabalho.( Rondes, que também foi engraxate, inclusive, entre seus clientes especiais estava a própria mãe do Dr. Michel, exceto ele que então era casado e já vivia em casa separada)
Rondes nos faz saber que Dr Michel foi presidente do lendário Flamengo do Véio. Como desportista nato que era, abraçou realmente a causa, sendo atuante no dia dia do time, inclusive era quem, bancava as " cervejadas" depois das vitórias do time. E como era um escrete imbatível na região, era comum Dr Michel subir em uma cadeira no Bar Rio Branco, (onde rolava as festivas) para discursar.
Rondes, numa carta anexa ao poema, dá seu depoimento sobre a Capela de Santa Luzia:
"Conheci a Capela de Santa Luzia. Uma jóia de singeleza. Foi uma insensatez ( Ou burrice) demolir a Capela depois que a igreja ficou pronta, para dar extensão de um quarteirão ( praticamente sem continuação da Av.R.B) avenida. Deveria ter sido recuperada e permanecer uma ao lado da outra. ( passado e presente) certamente um atrativo que a cidade deixou de ter. " Demolidores"não perdem tempo"
Antes do anunciado poema do Dr Michel e antes que alguém, critique, por lamentarmos aqui, a demolição da antiga Capela. Nessas Minas Gerais de tantas histórias, ela deveria e poderia ser preservada. Ou será que não mesmo.
Nossos melhores elogios aos que se envolveram na obra de restauração da Igreja Santa Luzia. Certamente um trabalho árduo e envolvente, coroado de sucesso. Um verdadeiro Cartão Postal no coração da cidade. Vê-se novas rampas, adaptação dos banheiros, iluminação moderna, novos pisos, vitrais coloridos, novo sistema de sonorização, novos sinos, pintura atraente e uma obra justa: o busto do Pe.Eustáquio, ( que ministrava na antiga Capela) Muita, técnica, arte e bom gosto, envolvida obra de restauração. Com um detalhe exemplar: Não tocou na originalidade da construção. Parabéns!
Mas, porém , contudo e entretanto a antiga capelinha, podia ter sido preservada e restaurada no passado. Marchado de Assis já dizia: "Passado, presente e futuro devem coexistir harmonicamente na mente humana. Quando um deles é priorizado e os demais são totalmente esquecidos surge alguma espécie de desequilíbrio, ou, no mínimo, a hipótese de que algo não esta correto, não está bem."
Fala, meu saudoso "Homem de Branco ":
"QUERIDA VELHA CAPELA
Minha saudosa e querida Capela de Santa Luzia!
Saudade, quanta recordação, quanto amor!
Era 1924, eu tinha 9 anos; era engraxate. Todo domingo a gente ia esperar a missa acabar para engraxar os sapatos dos dândis da época. O mais importante daquela jovens era o Sr. Ilídio Pereira. Elegância requintada. Sapatos de verniz. Fáceis de engraxar. Duzentos réis a engraxada. Que dinheirão para nós!
Depois que o pessoal ia embora, eu ficava estático, contemplando a velha capela com os murais todos despencados como o muro da minha casa. O meu olhar de adolescente fazia uma algazarra louca em meu coração. Os horizontes eram delimitados porque meus olhos ainda não sabiam alcançar a beleza da realidade da vida.
Eu olhava o velho sono e sentia que seu tanger iimpregnava as batidas do meu coração. Meu olhar ingênuo contemplava a velha Capela como se fosse a Acrópole da velha Atena; e parecia que o afluxo de meu sangue cantava melodias dentro de minhas coronárias. Não sei por que a Capela de Santa Luzia me embevecia o olhar e fazia com que meus olhos penetrassem dentro de minha alma para conversar com o meu coração...Que papo bom de minha alma com o meu coração....
Capela de Santa Luzia, marco de uma geração que nunca exigiu pérolas alcatifando os seus humildes degraus, como se fossem mármores de Carrara... Meu olhar infantil não sabia ainda definir a grandeza daquele velho prédio, mas os impulsos de minha alma me diziam que era ali que esteve a presença de Deus.
Capela querida de Santa Luzia...Que Saudade!
O Acadêmico era médico. Ocupou a cadeira n° 9, cujo patrono é padre Mathias Van Root."