# Eustáquio Amaral

Folclore Patrocinense

8 de Novembro de 2016 às 12:27

Causos. Exageros à parte, eles existem. Contam passagens inesquecíveis. Relembram personalidades memoráveis. De onde veio o termo “rangeliano” para identificar a pessoa ou fato de Patrocínio? O gol de Bino é verdade? E o lenhador que rachava (a machado) um caminhão de lenhas ao dia? O maior placar do futebol nacional foi protagonizado por equipe da cidade? Confira e tire suas conclusões.

RANGEL 1 – Personagem do final do século XIX (provavelmente de 1870–1890), proprietário de rancho (pousada, alimentação e pasto para os animais dos tropeiros). Nesse rancho, localizado na região do Bairro Morada Nova, a alegria imperava e as mulheres eram a maior atração. Conta–se que Rangel teria assassinado sua esposa e passado a viver com uma das mulheres do rancho. A narrativa foi nos feita pelo mestre Sebastião Elói. Ele, a partir dos anos 40, em homenagem, criou o termo “rangeliano”. Pois, já existia o Córrego Rangel, outra homenagem ao rancheiro.

RANGEL 2 – Em 1853, outro Rangel foi poderoso. A história apresenta sua briga com um intelectual chamado Francisco Alves de Souza, que se destacou como um dos maiores jurisconsulto do País. Apesar de autodidata, tornou–se adepto dos pensadores franceses Montesquieu e Turgot. Nesse ano, houve renovação da Câmara Municipal. Entre os eleitos estava Antônio Corrêa Rangel, delegado de polícia. No momento da posse, todos foram oficializados, exceto o delegado–vereador, porque Francisco Alves levantou a dúvida da inviabilidade de acumulação de duas funções públicas. Irritado, Rangel, comandando a força policial, cercou o sobradão, onde funcionava a Câmara Municipal, o Juizado e a cadeia (no Largo do Rosário, depois Praça Honorato Borges). Ameaçou prender os novos vereadores. Novamente, a ponderação de Francisco entrou em ação. Consultadas as autoridades provinciais, reconheceram a irregularidade e o pouco esclarecimento da legislação. Por isso, sugeriram a posse. Em seguida, o vereador Antônio Rangel foi eleito presidente da Câmara e agente executivo (função antecessora de prefeito). E continuou delegado de polícia. Assim, Rangel acumulou três poderes, o Executivo, o Legislativo e o Policial. Segundo os historiadores, nenhum patrocinense, em tempo algum, teve tanto poder como Rangel. Simplesmente, um poderoso.

VINCENTÃO – Até os anos 60, os fogões das residências e os fornos das padarias eram movidos à lenha. O fogão a gás não era bastante conhecido nem utilizado. A lenha, vinda dos cerrados, chegava à cidade transportada em carros de boi e, mais tarde, em caminhões. Para condicioná–la era preciso cortar os troncos, para isso existiam os rachadores de lenha, entre os quais se destacava um negro forte, possuidor de uma sonora gargalhada, quase 1,70 de altura, residente no Sertãozinho (hoje Marciano Brandão). Uns o chamavam de Sô Vicente, outros de Vicentão. Alguns o conheciam por ser pai da popular Rufina. A remuneração pelo seu eficiente trabalho era curiosa. Uma garrafa de pinga e três refeições (arroz e feijão em grande quantidade) por dia, às sete, às dez e às dezessete horas, e, um baixo salário. Pão e café, intermediados nas refeições, também por três vezes ao dia. Passaram–se os anos... passou a Rufina... passou o tempo da lenha... passou o Vicentão... ficou a lenda.

24 A 0! – Nesta época maravilhosa, o Atlético Patrocinense, de Edvar e Gulinha, e o Flamengo (do Véio do Didino) eram a grande alegria de Patrocínio. Como um meteoro, surgiu e logo desapareceu um clube amador chamado Sete de Setembro, dirigido por Roberto do Cícero, conhecido e irreverente jovem da Rua Governador Valadares próximo a esquina da Rua Coronel João Cândido de Aguiar. Em um domingo ensolarado, da década de 60, o Sete de Setembro foi à Monte Carmelo, onde enfrentou o Operário Carmelitano. Na preliminar, jogaram as equipes de aspirantes. A de Patrocínio era comandada pelo atleta Fuzil, um crioulinho franzino, dócil e de frase de efeito. Um personagem do folclore patrocinense. Primeiro tempo: Operário 14, Sete de Setembro 0. No intervalo, Fuzil pediu raça aos companheiros, pois daria para empatar (!). O jogo no segundo tempo para o Sete de Setembro foi melhor um pouco, mas no final foi a maior goleada registrada no futebol mineiro, entre cidades. 24 a 0. Quiçá brasileiro.

FINAL DOS ANOS 50: INACREDITÁVEL! – Flamengo, Operário, Atlético Patrocinense e Independente eram os quatro clubes de futebol de Patrocínio. Corria na cidade a história do “Gol de Bino”. Esse gol teria acontecido em um jogo entre o Independente (time do ponta Bino) e o Flamengo. Um gol inexplicável, um gol impossível. Bino cobrou o corner e (ele mesmo) marcou o gol de cabeça. Algumas versões informaram que o gol teve a colaboração de uma forte ventania, que retardou a caída da bola. Outras versões afirmaram que Bino bateu o escanteio e correu para a área; um zagueiro rebatera a bola, caindo na cabeça de Bino que estava indo em direção ao gol. Verdade ou mentira, ficou registrado na agenda folclórica patrocinense o gol de Bino. O diretor do Jornal de Patrocínio, o bom Joaquim Corrêa Machado, nos afirmou que assistiu ao jogo do gol de Bino, realizado no Estádio Quincas Borges, próximo à Igreja de São Francisco (nos anos 60, o estádio foi loteado para financiar a construção do Estádio Júlio Aguiar). Velhos tempos. Belos tempos. É felicidade tê–los conosco. São lembranças de outrora.

Primeira Coluna publicada na Gazeta, edição de 29/10/2016.

([email protected])