# Eustáquio Amaral

ÍNDIO AFONSO, O TEMIDO PATROCINENSE QUE TERIA MATADO MAIS DE 110 PESSOAS

9 de Novembro de 2020 às 21:05

 

                                      

 

                                

Fantástica. Embora de pouco conhecimento entre os patrocinenses. É esta narrativa que serviu até ao escritor Bernardo Guimarães para escrever uma novela (história). É a história real de um cafuzo (índio e negro) ou mameluco (branco e índio) bem patrocinense. José Afonso ou Índio Afonso é o seu nome. Viveu aproximadamente de 1823 a 1887. Um bandoleiro terrível. Um bandido temível. Parte do conhecimento sobre o Índio Afonso chegou gentilmente a este cronista pelo pesquisador paracatuense José Aluísio Botelho.

 
   

 

PROVÁVEIS PRIMEIROS PASSOS – No censo nominativo de Patrocínio, em 1832, por nome dos moradores e por número das casas, já revelado por nós (base: Arquivo Público Mineiro), no fogo (casa) nº 207 foram registradas diversas pessoas com o nome Afonso, todos de cor parda. Entre essas pessoas, um menino chamado de José Afonso (9 anos). Todos lavradores. Tudo leva a crer que esse famoso José Afonso nasceu em Patrocínio. Nessa época, Patrocínio era distrito de Paracatu. A partir de 1833, passou a pertencer ao novo município de Araxá. 

 

 ONDE ATUOU – Índio Afonso cometeu inúmeros crimes na região compreendida entre Patrocínio e Catalão (GO), envolvendo onde são hoje Araguari, Estrela do Sul, Monte Carmelo, Abadia dos Dourados e Coromandel. Em 1861, Bernardo Guimarães, juiz de Direito em Catalão, disse tê-lo conhecido e deu notícias do Índio Afonso nas matas do Rio Paranaíba, que ele chamou de Rio Parnaíba. Em 1862, segundo Aluísio, houve notícia em jornal sobre o Índio Afonso e seu assustador bando na região. Em 1872, Guimarães escreveu a novela/história “O Índio Afonso”. É uma mistura de realidade e imaginação do grande escritor. A obra muito comentada na ocasião. E até nos dias atuais.

 

AUGE CRIMINOSO – Nas décadas de 70 e 80, do século XIX, há poucas notícias, pois havia poucos jornais. Contudo, há registros do grupo saqueando fazendas, arraiais, vilas e cidades, visando sustentar as famílias dos membros do violento bando. Por outro lado, fazendeiros e latifundiários davam proteção aos bandoleiros em troca de assassinatos de políticos adversários ou de gente simples adversária, e, de colaboração na expansão agrária de seus interesses. Sempre um poderoso coronel fazendeiro os protegiam (Afonso e sua gente). Enfim, esse bando comandado pelo Índio Afonso era uma milícia dos fazendeiros.

 

COM A AJUDA DOS CORONÉIS... – Em 1883, em Catalão, dois filhos do Índio Afonso, foram presos, depois de assassinar com extrema crueldade o cidadão Jerônimo Valadão. Mas fugiram... com a ajuda dos protetores. O delegado foi jurado de morte.  

 

CONFISSÃO ESTARRECEDORA! – Um pouco antes de sua morte (1887), Índio Afonso teria declarado em Patrocínio: “Tenho já 110 mortes. E o meu rosário (de mortes) ainda não está completo, porque de poucos anos a esta parte, dirijo apenas o braço de meus meninos (seus filhos João e dro), levando eles ao lugar do delito e esperando-os a pouca distância.Quem teria escrito essa declaração foi um letrado e não Afonso. Índio Afonso, naquela data, estava escondido na casa de Domingos Rabelo, filho do Coronel Rabelo.

 

MORTE QUE PROVOCOU REVOLTA – O bando do Índio Afonso se encontrava na região de Bagagem e Brejo Alegre (hoje, Estrela do Sul e Araguari). O juiz, Dr. João Correia de Moraes, juntamente com a família Machado, planejou a prisão do bandoleiro. A Gazeta de Uberaba, edição de 6/4/1887, noticiou o descrito pelo juiz Moraes: às nove horas da manhã do dia 10/01/1887, no lugar denominado Correias, às margens do Rio Bagagem, resistindo à escolta que o foi prender, morreu, em renhida luta, o célebre e legendário assassino Índio Afonso, com 80 anos. Nos anais do crime fica o nome desse facínora célebre, que foi, por longos anos o terror, da região. A glória de havê-lo morto coube aos irmãos Mariano Machado e Feliciano Machado...” Um terceiro Machado morreu e houve várias outras pessoas feridas no combate. Todavia, polêmicas e reações contra o juiz surgiram, que teve que pedir proteção policial. Índio Afonso foi sepultado no lugarejo Rio das Pedras (hoje, Cascalho Rico).

 

RAZÕES DOS REVOLTOSOS – Os desafetos do juiz o acusavam de ter mentido. Pois, Afonso teria sido assassinado, sem direito de defesa, em tocaia. E que o homem de Patrocínio, na verdade, era um justiceiro. E que fazia o bem para as pessoas humildes. Não era um cruel assassino, como registravam as crônicas policiais. Os políticos também criticaram o juiz, inclusive o Promotor, Dr. Teodoro Dias Júnior.

 

O BEM AMADO MALFEITOR – O jornal “Novidade”, do Rio de Janeiro, de 6/7/1887, escreveu sobre o pistoleiro patrocinense: “... o famoso Índio Afonso, um salteador a valor, um verdadeiro bandido de romance, que fora o assunto de uma novela (livro) de Bernardo Guimarães, e era o orgulho e, ao mesmo tempo, o terror de tais paragens. Pois bem: o juiz entendeu que o Índio Afonso era um mal... uma bala perdida e desastrada deu cabo do chefe da quadrilha, privando a província de Minas Gerais e todo o Império do Brasil, de um dos seus melhores e mais ilustres bandidos.

 

PORÉM... A SAGA ASSASSINA DOS AFONSOS CONTINUOU – A morte do chefe do bando (Índio Afonso) aumentou o medo na região. Os filhos (Pedro e João) juraram vingança. João Pereira Afonso, o filho mais velho, passou a chefiar o bando. Um a um, os dois Machado, que participaram da morte do Índio Afonso, foram assassinados por vingança. Outros Machado morreram da mesma forma, nessa região limítrofe de Minas e Goiás. Assassinatos e saques nas fazendas aumentaram demais. Aí surgiu um delegado implacável, capitão Fortunato José da Costa Lana. Primeiramente, delegado em Bagagem, depois delegado em Patrocínio. A ordem era matar sem piedade, inclusive crianças e mulheres, os membros do bando. Isso ocorreu com parte do bando (Índio Raimundo) em 1891.

 

O CRIME QUE ABALOU PATROCÍNIO – Em 3 de outubro de 1889, os índios Afonsos armaram uma emboscada e assassinaram, nas proximidades de Abadia dos Dourados, o juiz de direito de Patrocínio, Eloy David Benedito Ottoni, de família política do Serro. Crime praticado a mando dos Rabelos. Essa parte da história também foi contada a este cronista, há quarenta anos, pelo jornalista Sebastião Elói. E é de conhecimento histórico no município de Patrocínio.

 

RABELOS PROTETORES DOS AFONSOS – O bando dos Afonsos em            Patrocínio recebia vida segura e protegida do Coronel Rabelo (Joaquim Antônio de Sousa Rabelo) e de seus filhos Domingos Rabelo da Fonceca e do tenente coronel José Rabelo da Fonceca. E até do padre Elias Luiz da Silva, aliado dos Rabelos. Todos inimigos do juiz Ottoni. Os Afonsos usavam as terras (fazendas) dos Rabelos para plantarem roças para subsistência e, morarem. Por isso, a grande suspeita do mandante do crime caiu em cima do Coronel Rabelo e de seus filhos. Isso já narrado por nós.

 

CONFISSÃO DE RABELO – No decorrer do inquérito policial, o ex-agente executivo (prefeito) de Patrocínio, José Rabelo da Fonceca suicidou-se. E deixou um caderno de anotações dizendo “ter mania de perseguição, e, sentindo-se perseguido pelo juiz Ottoni, por isso mandou matá-lo”. Os outros réus foram inocentados, apesar de provas circunstanciais, que apontaram os índios Afonsos como mandatários (executores dos crimes) e a família Rabelo, como mandante. Os historiadores afirmam que o coronelismo e poder já significavam impunidade, naquele tempo.

 

VERSÃO CONFIRMADA – O trabalho técnico de Aluísio Botelho ratifica o que o pesquisador genealógico patrocinense, Adeilson Batista, disse. Quem suicidou-se foi o filho do Coronel Rabelo. E o Coronel Rabelo faleceu algum tempo depois do crime (1897). Além do crime desse juiz Ottoni não ter ocorrido no Largo do Rosário (Câmara Municipal, que ficava onde é hoje a região do Instituto Biblíco). Assim, e diferente a versão da escritora Lindalva Machado Fonseca. Portanto,  é intrigante. É envolvente. A história dos Rabelos e agora dos Afonsos, em Patrocínio.

 

TEM MAIS... – Nas próximas edições, outros pormenores dos índios Afonsos. Além da visão suave e literária do Índio Afonso, por Bernardo Guimarães.

 

FONTES – “Os Índios Afonsos nos Jornais da Época (século Dezenove)”, escrito pelo célebre José Aluísio Botelho. Que merece nosso agradecimento. Além, como fontes Adeilson Batista, Sebastião Elói, Mapa Populacional de 1832 do Arquivo Público Mineiro e o “O Índio Afonso” de Bernardo Guimarães. E acervo deste cronista.

                                                                                            

([email protected])                              Publicado também na Gazeta, edição de 31 de outubro de 2020 .