Interpretação. A história também tem a sua. Sempre revestida de documentos. Quando os fatos apresentados divergem, tornam-se intrigantes, polêmicos. Isso aguça os pesquisadores e historiadores. A inteligente escritora Lindalva Machado Fonseca, patrocinense, falecida nos anos 80, tem sua visão das mortes do Juiz Eloy Ottoni e Coronel Rabelo, em seu livro “Fios Emaranhados”. Visão essa da família de destaque Machado, contemporânea de Ottoni e Rabelo. O excelente pesquisador genealógico Adeilson Batista, por outro lado, tem a sua visão, utilizando-se de certidões de óbito. Esse confronto é muito saudável e enriquecedor, em termos históricos.
ONDE O JUIZ FOI ASSASSINADO? – Nessa semana, Adeilson nos apresentou a certidão de óbito do Doutor Eloy David Benedicto Ottoni, datada de 19/6/2011. Por ela, o juiz faleceu no dia 3 de outubro de 1889, num lugar denominado Ponte Alta, às 12h, no seu capão (cavalo). Lindalva, com apoio de seu tio Tobias Machado, vizinho da Câmara Municipal, que teria visto o morto, escreveu que o assinado foi à porta da Câmara, à noite (21h). Sebastião Eloi, o ícone do jornalismo rangeliano, afirmava que o juiz teria sido assinado na estrada de tropeiros e cavalos que ligava a cidade e os (então) distritos de Coromandel/Abadia dos Dourados. O seu sepultamento foi em Patrocínio.
JUIZ DE POUCA IDADE – Segundo a certidão de óbito, Eloy Ottoni tinha 36 anos, solteiro, mas pai de alguns filhos naturais. Filho do doutor Eloy Benedicto Ottoni e natural de Itabira de Matto Dentro. Porém, a história maior registra que a família Ottoni era de Serro.
FILHO DO CORONEL RABELO – Quem suicidou-se foi outro Rabelo. Conforme a segunda certidão de óbito, também de 9/6/2011, apresentada por Adeilson, em 15 de maio de 1890, às 20h, na fazenda de São José dos Tolhados, o tenente coronel José Rabello da Fonseca, de 50 anos, casado, fazendeiro, cometeu suicídio. Era filho legítimo do coronel Joaquim Antônio de Souza Rabello (coronel Rabelo) e de Anna Felisbina de Souza. Deixou oito filhos (de dez a 28 anos de idade). Portanto, suicidou seis meses após a Proclamação da República. Foi sepultado na cidade.
CONFUSÃO DE SOBRENOMES – De onde vem o “Fonceca” do José Rabello Fonceca? Do pai não é. Da mãe também não. Todavia, a esposa de José tinha “Sousa”: Theophila Maria de Sousa. E o sogro dela, o Cel. Rabelo, era Joaquim Antonio de Sousa Rabello. Que barafunda!
CEL. RABELO FALECEU SETE ANOS DEPOIS... – A terceira certidão de óbito apresentada por Adeilson Batista, que é descendente da família Rabello, datada de 9/6/2011, demonstra que o maior dos Rabelos morreu em 23 de maio de 1897, com 80 anos de idade “mais ou menos” (expressão da certidão), natural de Sant’Anna do Garambéu. A causa mortis foi lesão cardíaca, (morte) que ocorreu às 19h, daquele dia. Isso conforme atestado médico do Dr. Jozias Leopoldo Victor Rodrigues. No entendimento de Lindalva Machado, Coronel Rabelo se matou no dia seguinte à Proclamação da República. Ou seja, por volta do dia 20 de novembro de 1889 (a notícia da capital demorava chegar ao interior do Brasil).
DÚVIDAS NO AR... – A certidão de óbito do Cel. Rabelo é baseada pelo atestado de um médico de Goiás (Dr. Jozias). Araxá, bem próximo, Bagagem, Paracatu e Uberaba tinham médicos. Por que nenhum médico desses municípios foi chamado? Já Santana do Garambéu é um pequeno município mineiro criado somente em 1963. Antes, foi distrito de Barbacena, depois de Lima Duarte. Se era obrigatório colocar o nome do município nas certidões de nascimento, então o poderoso Rabelo nasceu em Barbacena. Se distrito podia ser colocado na certidão, bastava Garambéu, conforme a história daquela região.
OUTRO TESTEMUNHO DA FAMÍLIA – Em abril, Maria D’Arque Rabelo, provavelmente residente na cidade, por e-mail, disse que acessou o inventário do Coronel Rabelo. Nele, há uma dívida com o Padre Modesto Marques Ferreira, de 24/5/1898, pela celebração da missa de 7º dia. E suicida, segundo ela, não teria missa. Parece que o inventário teria sido movimentado apenas cem anos depois da morte do Cel. Rabelo. No mais, a boa pesquisadora D’Arque ratifica as palavras de Adeilson.
PERSONAGENS –
ENFIM – É história para ser bem pesquisada. Analisada. E convergida. Vale a pena discutir a Patrocínio de tempos que se foram.
Crônica publicada na Gazeta, edição de 10/10/2020.