# Milton Magalhães

Os Cinco Tiros de Jorge Marra...

30 de Setembro de 2020 às 15:13

( Imagem ilustrativa) De certa forma um dos cinco tiros desferidos contra Cássio Remis, me atingiu. Os outros atingiram: A família Remis...a família Marra... e a  nação patrocinense como um todo.

De como a bala me chegou quente no peito. Fiquei ( E ainda estou) Atordoado. Entorpecido. Chocado e Comovido. No primeiro instante, a minha  certeza era que aquilo tudo não passava de uma  bitela mentira. (Fake News)...Antes fosse... Logo vazou a  imagem, do seu corpo estendido na calçada... Cena forte... Um amigo abatido, cuja imagem  vai continuar arrancando meu sono e algumas lágrimas madrugadas afora. E se... E se... Fico imaginando outras cenas. Outro final possível. Tinha que ter ali um braço corajoso que impedisse o fato. Tinha.  Não teve?  Como assim?

Desde que me entendo por gente, tragédias humanas previstas, previsíveis,  controláveis, evitáveis, tragédias anunciadas,  me arrasam, me tiram o chão, me asfixia a alma.  Alguma coisa em mim morre e o luto não se cura com o tempo. Talvez o que morre se chama: Esperança na humanidade. Fico constrangido diante  de Deus. É quando faço uso das palavras de Esdras:  “Meu Deus! Estou confuso e envergonhado, para levantar a ti a minha face …” É quando Deus me mostra uma criança sorrindo; uma borboleta multicolorida cruza meu olhar; uma flor que cresceu ao sol quente  entre as gretas da calçada; aquele  vira-lata, antes abandonado, ferido em acidente, foi adotado, passa por mim feliz, abanando o rabinho; uma mulher de 100 anos, que se cura da Covid,  é aplaudida de pé por médicos e enfermeiros e volta para os braços da vida. Dai, ensaio um pequeno riso e digo pra mim mesmo. “O Senhor é custoso,  hein, Deus!” É assim que minha espiritualidade não vai a pique. Recebo lufadas de alento. Então, entre monstros e anjos, claudicante, prossigo...

Mas, a  dor está lá. Se somam a outras. São eternas...

Ainda me dói me  lembrar,  por exemplo do Incêndio no Edifícil Joelma; Ainda lateja, lembrar da Tragédia na Boate kiss no Rio Grande do Sul; Das Torres Gêmeas; Do Incêndio no Centro de Treinamento do Flamengo; Da tragédia no Centro Municipal de Educação Infantil Gente Inocente; Do Rompimento da barragem de Brumadinho...

A dor na’lma volta sempre que história  cita Hiroshima, Nagasaki, sem falar em  holocaustos, genocídios,  guerras e tragédias que mancham a história humana na terra. Dói por que sou humano. Dói por que faço parte da humanidade. Todos que morreram executados, queimados e soterrados, tenho consciência de que  eram meus irmãos.

Sim. Tem gente que tira de letra, mas eu não me dou bem com a  violência, a injustiça,  a dor e o luto...A cura não me chega com o tempo...

E agora, a cena em tela, foi na minha cidade. Começou bem aqui na Avenida João Alves do Nascimento, terminou,  logo ali,  na Secretária de Obras... Quase deu para ouvir o baque dos  disparos... 1, 2, 3, 4, 5. Repito, os cinco estampidos atingiram o Cássio, mas em certo sentido, um atingiu a mim...o outro a família Remis...o outo a família Marra... e o outro  a  Nação Patrocinense como um todo.

Cambaleando com a minha bala alojada no peito. Anestesiado, vejo, revejo, as imagens que proliferaram, ainda  não quero acreditar. Aquilo  não  foi um lapso,  foi um apagão de consciência...

O ocorrido  nos pede reflexões séria para que jamais volte a acontecer.  Joga na cara de todos nós a fragilidade humana diante de um foco de tensão. Como cultivar um distanciamento emocional em momentos de alta tensão? Somos todos analfabetos emocionais? A gente de nossos dias não sabe mais contar até tres?  Não sabe mais ouvir a voz contrária?

Infelizmente, entra para a história como exemplo de  um homem com 60 anos vividos; Se fracionados, são   21.900 dias de vividos;  525.600 horas vividas,  e 31.536.000 minutos vividos  e aquele trágico minuto de bobeira que muda toda uma existência. Um ato radical que manchou de escarlate sua trajetória de vida e por tabela,  a de muitas outras. É disto que trata essa  crônica.

Em mim dói, por que fui amigo dos dois. Tenho em grande conta as duas famílias. A cidade, ainda de pequeno porte, nos permite criar laços, saber tudo de todos. Que morreu é  muito conhecido; quem matou também é.

Encontrava-me continuamente com Sr Jorge Marra. A calçada de sua residência era meu “caminho da roça “. Ele estava sempre chegando ou saindo apressado em sua Hilux prata. Era só uma saudaçãozinha, matuta: -"Batuta Sr Jorge?” -“Bem Graças a Deus”.  Algumas vezes,  um dedinho de prosa, pois ele estava sempre “apertado de costura”. Mas sempre quis beber um cafezinho com ele. Se possível, na cozinha da sua fazenda.

Em  Cássio, via uma liderança nata, inconteste, emergente e se qualificando cada vez mais para assumir responsabilidades maiores  na vida pública. Via nele, um prefeito, um Deputado Estadual, Federal e oxalá, um Senador.

Quem  por estas plagas,  amava mais a vida pública do que ele? Qual político se orgulhava mais da Bandeira de Patrocínio do que ele?

Era meu amigo e incentivador. Espinafrava e bajulava.  Além do respeito, tinha por ele um cuidado que soava paternal.

No seu primeiro mandato para vereador. Lá estava eu, por volta de 2009/2012, no alto de minha petulância, querendo lhe aconselhar:

“Pois é, Cássio, o significado de seu nome é: DISTINTO, ILUSTRE; Isto me deixa a vontade para me dirigir a você, pois quero de coração, que você seja um líder útil de verdade, DISTINTO, ILUSTRE; e não um ( #%) qualquer. Você é um jovem disposto a servir a causa pública, tem muitos horizontes pela frente. Não tenho a pretensão de lhe dar lição de moral, mas um pequeno insight. Está na cara que você precisa de discernimento e muita humildade para se debruçar sobre o passado, conhecer de fato a nossa identidade histórica, nossos valores. Esqueça este caminho de bravatas, valentia e populismo. Conheça o trabalho, a têmpera e a vocação dos grandes homens públicos de todos os tempos, para se contextualizar e buscar subsídios para o seu crescimento como homem público. Mais do que ar, pão e água, busque uma consciência firme e equilibrada, como se deve a um líder...”

Outros e outros textos vieram com críticas construtivas e elogios verdadeiros ao seu trabalho.

Para minha alegria se tornou Dr. Cássio. Indiquei-o  para um amigo. Estivemos   em seu escritório. Não disfarcei minha satisfação em ver sua fulminante ascensão profissional. Ia longe no ofício.

Baseado na sinceridade, e na admiração mútua, nossa relação se consolidou com o passar dos anos. Os vídeos que fazia, me preocupava, me culpo por não ter falado mais a ele nesse respeito.

A última mensagem que recebi dele, via Instagram, me agradecia por uma publicação:

 “Bom dia Milton. Vc sempre muito especial, receba meu carinho e abraço fraterno. O brigado por tudo”

Disse que um dos tiros atingiu a família Remis.  E foi bem isto.  No lar dos Remis na rua Jacob Marra, sempre se  respirou  política. Marcão, o pai, sempre foi figura de proa, na política rangeliana. Foi vereador combativo, por duas legislaturas;  candidato a Deputado Estadual e Secretário Municipal de Esportes e Lazer, com saldo positivo de trabalho. Tinha um par de olhos que lhe acompanhava bem de pertinho. “Quero ser igual a ele quando crescer”.  E cresceu.   O pai caminhava para “pendurar as chuteiras” e ficar na retaguarda; o filho entrava em cena com o seu brilho. Era orgulho em mão dupla.

E uma data de aniversário do pai o filho disse:  “..Mais um ano de vida do meu pai o Prof Marcos Remis, quero agradecer a Deus o privilégio de ter me enviado em uma família alicerçada na honradez e na dignidade, e que com muita saúde e paz continuaremos juntos trilhando o caminho da retidão. As palavras ensinam mais os exemplos arrastam.”

Mesmo tocado pela emoção no dia do velório, seu pai, Marcos Remis,  achou forças para dizer em uma entrevista: “ Cássio, foi criado na barra da minha calça. Desde menino dedicou a vida inteira a política. Não teve infância, não teve balada. Foi o mais novo vereador da história aqui e também o presidente da Câmara mais novo da história de Patrocínio”.

Legítimo que o pai  e a mãe honre a sua memória..

E falando na  mãe, quando ela se aposentou, depois de 38 anos, grande parte na gerência do INSS local, Remis, o filho,  disse:  “Quero neste momento externar minha imensa alegria ao ver publicada a aposentadoria da minha querida mãe Francisca Carneiro Santos carinhosamente chamada de Chiquita do INSS. Reportar neste espaço os seus efeitos e ações anônimas, realizadas ao logo destes anos de serviço público, ficaria aqui dias e até meses discorrendo de algo que fez e exerceu com muita dedicação, amor e na maioria das vezes, tendo um sacrifício pessoal, renunciando o seu direito sagrado ao descanso e convívio familiar para servir aqueles que do seu auxílio precisava, e na sua maioria pessoas simples e indefesas que dos seus direitos muito pouco ou quase nada conhecia, sempre tiveram nas ações voluntariosas da querida Chiquita o amparo e dedicação para encontrar uma solução as dificuldades...”

Falta palavra para descrever  a dor  da esposa,  Profª Nayara Remis, a grande incentivadora do esposo. Semelhante a uma  casa que perdeu o esteio, uma andorinha que perdeu o rumo,  uma casa com jardim devastado, ela perdeu o amor e   os planos de uma vida. Em algumas entrevistas, Nayara  aparece com as mãos postas em oração, como quem busca força em Deus pra prosseguir. É que olhe resta. É o que vai lhe sustentar. Deus é bom e nos vales e nos montes que virão, vai lhe emprestar a força Dele.

O irmão, Marcos Remis Filho, tinha no irmão,  o seu espelho. Com a voz embargada pede justiça: “Estamos ajuntando os cacos”

Mas, o outro projétil que saiu da arma de Jorge Marra, atingiu a sua própria família.

Atingiu o pai na altura de seus 91 anos. A cidade conhece e sabe que  ele não criou o filho para um ato bárbaro deste. Quem duvida, prova. O filho que lhe dava tantas alegrias, na infância, adolescência, na juventude, lhe deu essa imensa tristeza no outono da vida. Digo isto por que teve um ato na porta de  sua casa. Tentam jogar em seu colo,  uma  dívida que não lhe pertence. A dívida não, mas  a mancha sim. O criminoso pertence a família. Em proporções infinitamente diferentes, há dor de ambos os lados.

Atingiu o próprio Prefeito, que não tem como negar que é seu irmão.  Deu-lhe um cargo de confiança, era, até então correspondido. Foi traído, por um ato bárbaro,  que deve ser assumido, diante da justiça, somente por quem, deliberadamente o praticou.

Isto é dito por que, estamos em um dos momentos mais críticos de nossa história.  A Ao fundo desse assassinato brutal, a pandemia continua ceifando vidas e as eleições  estão ás portas.

O momento, que ainda  é de estarrecimento, dor,  luto,  orações, serenidade, consolo aos familiares e espera por Justiça.  Não se admite  o uso político/ eleitoral e emocional desta situação.

Como pode...  Um homem de fala mansa,  timidez caipira,  sabedoria empírica. Um dos melhores secretários de obras que Patrocínio, já teve, tanto na roça.  Um dos maiores construtores de pontes (que ironia);  quanto na cidade. Construção do novo Pronto Socorro, canalização e revitalização da Avenida João Alves do Nascimento. Um assassino.  Isto é fato...

Disse  que só pretendia por fim a uma live, mas pôs fim em uma life. Que sinta o peso da Lei. Que receba na Justiça, sanção penal a altura  do  ato bárbaro  cometido...

O outro tiro,  atingiu a Nação Patrocínio... A saber,  Patrocínio,  etimologicamente, significa, amparo, auxílio, proteção, arrimo e abrigo. A cidade mais miscigenada da região, não é Uberlândia, como se pensa,  é Patrocínio.  A cidade que mais acolhe bem as pessoas, de todas as classes sociais,  não é Uberlândia, como se diz,  é Patrocínio. O  Brasil inteiro  precisa saber disto.

O Brasil inteiro precisa saber que Patrocínio,  é a “Jóia do Alto Paranaíba.” O patrocinense, na sua essência,  é humano, solidário, ordeiro,  pacífico e trabalhador. Há violência diária e pontuais, sim, mas a Polícia e a Justiça,  respondem rápido para que a paz social reine.

O Brasil inteiro precisa saber que o município de Patrocínio, é  rico, impar e singular em todos os aspectos. Esta gleba de solo, encanta e fascina pela sua diversidade, pelo seus valores únicos, pela força do agronegócio, por seu comércio ativo,  por sua cultura única, por sua religiosidade, por seu clima único, por seu rico potencial turístico (inexplorado), sobretudo, pelo seu jeito típico de “patrocinar” e aconchegar a todos,  sem distinção.

O Brasil inteiro precisa saber que em  Patrocínio, nascidos de suas entranhas ou não, aqui todos são chamados de filhos. Aqui não se  tem nomes pejorativos para quem não nasceu em seus domínios. Não existe “patrocineba”, “ patrocinídios”, coisa do gênero. Todos somos Patrocinenses.

O Brasil inteiro precisa saber que em  Patrocínio,  muitos, até detestam que lhe digam que nasceram  em outro lugar. Exemplos disto,  é o que mais temos. Mas,  o caso de Cássio me chegou como  surpresa.  Pai, Marcão disse  em uma de suas entrevistas,  que o filho  não havia nascido aqui. Inclusive um “Título de Cidadão Honorário” passou a mofar lá nas gavetas da Câmara Municipal. Não tinha sentido nenhum pra ele. Nem para ele e nem para nós. Era mais patrocinense do que nós todos juntos. Repito.  Cássio era o  Político que mais se orgulhava de Bandeira de Patrocínio.

O Brasil inteiro precisa saber que a  Nação Patrocinense,  há muito,  clama  por um projeto sócio-político-econômico-cultural-educativo-turístico-ambiental a curto, médio e longo prazo que corrija a nossa defasagem de progresso histórica. Mas nossos políticos não tomam vergonha,  não alinham  força para um  trabalho, pacifico,  honesto e inteligente.

O que que  Brasil inteiro precisa saber, é  que, juntamente com Cássio,  Patrocínio,  também  levou um tiro. É dolorido estar  nas páginas  policiais do país inteiro. Sikêra Júnior, Datena, Jornal Nacional, O Globo,  Folha, Correio Brasiliense, Estado de Minas, O Tempo, Hoje Em Dia, etc,  etc, fazem bem em colocar em suas manchetes,  o crime estarrecedor que foi. Fazem muito bem fazer coro em  no clamor  de justiça para o caso.  Lágrimas ainda rolam...O tempo é de luto... Ausência e a memória  de Cássio estará  eternamente viva entre nós.

Mas, aqui não é “ terra de coronéis”,  “ terra de  bang- bang”,  “ terra onde se  resolve tudo na bala”, como muitos de vocês disserem ou inferiram.  Um milhão de vezes, não!  Foi algo abominável, sim, mas a violência não é inerente ao nosso povo. Um dos tiros de Jorge Marra, atingiu também, o  âmago da  Nação Patrocinense.

Depois do luto,  uma luta...

Conto com a grande mídia para um pacto nacional. Vamos  honrar a luta e vida de Cássio Remis, divulgando positivamente a cidade que ele tanto amava..