# Milton Magalhães

Perambulâncias literárias

15 de Setembro de 2020 às 13:16

Mesmo com o sol escaldante, o vento açoitando tudo, fazia uma pergunta de mim pra mim mesmo na tarde de domingo: Onde encontrar um lugar para ler em Patrocínio?

Claro, que este lugar é em minha casa. Mas eu queria outro lugar. Quem entende o bicho ser humano. Depois que o Príncipe Charles Trocou a Princesa Daiana pela Camilla Parker, todo mundo tem o direito de fazer qualquer troca.

Como já disse, obedeço ordens superiores. Marido inteligente, anda com o alvará de soltura em dia. E outra coisa, tem hora que voce se sobra em casa. Se a casa é pequena então, mermão,  parece que a vassoura persegue o camarada na casa toda. É preciso ter desconfiômetro. O meu está zerado. Além do que, tomo meu simancol regularmente. (Cabe um parêntese, aqui, minha esposa, é incrível. Dócil educada e fácil convivência. Mas quer saber onde o marido vai é um direito)

Consentimento dado, dois livros escolhidos, máscara na cara, garrafinha d’água, pé na estrada, ou melhor bicke na rua.

“Voce foi fazer um ‘pedal’, Milton?” Mais ou menos. Fui fazer um ciclismo, flanar de bicicleta mesmo. As coisas vão mudando de nomes, adquirindo novos conceitos, mas no fundo, a função e funcionalidade é a mesma. Por exemplo. Há muitos e muitos anos eu ia na Academia do Barrela, ali na Presidente Vargas, “fazer ginástica”; dali a pouco ás pessoas ia numa academia “malhar”, agora vão “treinar”. Mas o que importa termos. Importante é que todos vão cuidar da saúde.

Voltando á bicicleta, constado, com entusiasmo, sobretudo nos finais de semana, que devido á pandemia e  distanciamento social, o número de praticantes de ciclismo (pedalismo) tem aumentado e muito na cidade. Não é difícil ver grupos de 10, 20, saindo ou chegando na cidade. As bikes sujas falam de um longa aventura por ai. As vezes amigos, pais e filhos,  todos paramentados, praticando um dos melhores exercícios físicos. Até é bom aproveitar para pedir aos motoristas e motociclistas que respeitem os ciclistas. Na verdade, que haja respeito mútuo. E a prefeitura, através da Secretaria de Esportes, deveria, criar e dotar de segurança os roteiros para ciclismo esportivo e pedal amador no nosso muncipio. 

Pustsgrilo! Fui falar em bicicleta, ai essa crônica empacou de vez... Um lugar para ler. Biblioteca Pública de Patrocínio? Se seu horário de funcionamento, é de 8h às 17h30min, de segunda a sexta-feira. A noite, esquece. Sábado, esquece. Domingo nem lembre. Bem entendido, questão de segurança, disponibilidade de funcionários e o interesse de leitores que não anda lá muita coisa.

A prefeitura, ( lá vai eu mexer com a prefeitura de novo, sei que eles tem mais o que fazer) Poderia construir espaços público para leitura. bancos de praça | Livros só mudam pessoasUm recanto tranquilo, com silêncio, segurança e se não for pedir muito, alguns bancos confortáveis para leitura. O livro a gente leva.

Deixa-me atalhar com essa detalhação. Passei pela Praça, Queiroz Teles, conhecida com Praça do Tiro de Guerra e agora, revitalizada, Praça da Bíblia. Tudo muito bom. Tudo muito lindo, mas, antes de concluir que não é lugar para leitura, um detalhe me chamou a atenção. Um monumento no meia da praça traz uma Bíblia aberta no versículo que Bolsonaro tanto cita. João 8, 32: “ Conhecerei a verdade e a verdade vos libertará” A palavra “verdade” já foi quase arrancada. Fui dali, pensando. Se lá estivesse escrito “ Conhecereis a mentira e a mentira vos libertará”, pode ter certeza que ninguém mexia em nada...

Já estava lá bairro Belvedere. Praça da Rodoviária . Já ia me render á sombra de uma árvore qualquer, mas, se passei pelas melhores praças arborizadas e não parei, ali é que não ia ficar. Resolvi, tomar apenas uma água e pedal pra que te quero.

A custo, cruzo a Br 356, (foto) pois bicicleta e rodovia, não combinam. Uma não foi feita pra outra. Não estrada que vai para o Cristo Redentor. Uma dúvida cruel. Onde vou Sigo. Na minha frente, três caminhos: Se sigo reto, vou sair no Hotel Fazenda Recanto da Serra. Nada mal para leitura. Seria bem- vindo? E se a proprietária, ex- vereadora, Marte Elias, mãe da Deputada Federal Greyce Elias, estivesse lá. Bom, poderia perguntar a Marta, se ela vai se candidatar á vereadora, um bom estava garantido, a leitura não sei.

O outro caminho seria, o Cristo Redentor, lá no alta da Serra do Cruzeiro. Roteiro descartado. Calor, vento e morro brabo, a vista com certeza valeria a pena, mas não sobreviveria para contar a história.

A outra opção, era á direita. Tomar a chamada Avenida da Penitenciária, do Memorial Jardim dos Ipês e do Aeroporto.

De cara o que mais me chamou a tenção foi o nome da Avenida. Vou até escrever em letras grandes: AVENIDA VEREADOR MANUEL CARLOS DE JESUS – (MANELICO). Ora, porque ninguém fala o nome desta avenida? Não é “Avenida da Penitenciária”, ou “avenida do Aeroporto”. É, AVENIDA MANUEL CARLOS DE JESUS – (MANELICO).

Manelico, era negro, construtor, humilde, muito querido por todos na cidade, foi vereador de Patrocínio por 04 mandatos. Foi desportista, camisa dez de diversas times na cidade. Inclusive foi quem marcou o primeiro gol no Estádio Júlio Aguiar nos anos 60. Manelico faleceu em junho de 2016. A lei que denomina a referida avenida foi de autoria dos Vereadores Roberto Margari de Souza e Neuza Mendes. Uma da homenagens mais justas, pois Manelico foi um dos vereadores mais popular em Patrocínio. Ajudou muita gente. Faleceu, aos 83, quase esquecido. Aqui, portanto, o nosso pedido, não vamos deixar seu nome cair no esquecimento. E somente dizer: AVENIDA MANUEL CARLOS DE JESUS – (MANELICO). Combinado?

Percorrendo, portanto a AVENIDA MANUEL CARLOS DE JESUS – (MANELICO), pensando na finitude da vida e na ingratidão humana. Onde Chego? MEMORIAL JARDIM DOS IPÊS. Parei. De cara um imenso jardim convidativo, além do paisagismo, a arquitetura, encanta. Pode ter certeza que ali um ponto turístico na cidade. Um lugar pensado para os nosso mortos considerando no bem estar dos vivos.

De repente, achei o que queria. Não sei se aquilo é um Caramanchão, pergolado, ou tem outro nome, pra mim foi o espaço de Leitura que buscava e reflexão. Tive uma conversa gostosa com a minha alma. Li outras coisa mas só consegui pensar nestas duas sínteses de Joseph Addison e Ricardo Gondim:

“Quando olho para as tumbas dos grandes homens, qualquer resquício do sentimento de inveja morre dentro de mim; quando leio os epitáfios dos magníficos, todos os desejos desordenados desaparecem; quando me deparo com o sofrimento dos pais em um túmulo, meu coração se desmancha de compaixão; quando vejo a tumba dos próprios pais, lembro do quanto é vão chorarmos por aqueles a quem logo seguiremos; quando vejo reis colocados ao lado daqueles que os depuseram, quando medito sobre os espíritos antagônicos enterrados lado a lado, ou os homens sagrados que dividiram o mundo com suas discussões e contendas, medito, cheio de dor e surpresa, sobre a pequenez das disputas, facções e debates da humanidade. Quando leio as variadas datas dos túmulos, algumas recentes, outras de seiscentos anos atrás, penso no grande Dia no qual seremos todos contemporâneos, e faremos nossa aparição conjunta.”

"O tempo deixa de existir para os mortos. Para eles, não há antes ou depois. O assobio do vento cessa nos túmulos e os ouvidos já não captam o cicio da aragem ou o rugir da tempestade. Para quem expirou, os teatros jazem desabitados – sem flautas, trompetes, pianos, pandeiros ou harpas. No reino da morte, os olhos não percebem a beleza – os vitrais da catedral não possuem esplendor, a beleza do pôr-do-sol é inútil e o luar do sertão não possui trovador para cantar sua beleza."

Um passarinho, insistia em chegar por ali, efeito do simancol, achei por bem deixar que ele também desfrutasse daquele lindo lugar. Tomei a AVENIDA MANUEL CARLOS DE JESUS – (MANELICO), de volta.

Nessa perambulância toda, sai de casa 9: 30 regressei ás 16: 30.

Nunca será somente um "pedal". Será o cuidado com o físico e com a alma. O sol talvez estivesse mais quente e o vento mais forte, mas minha alma estava mais leve.