Fotos: Pedro Pimenta
Nos dias 24 e 25 de abril de 2024, o Teatro da Fumaça, coletivo teatral fundado em Belo Horizonte, participa do festival norueguês Ibsen Scope como único vencedor brasileiro do Ibsen Scope Grant 2024. Dedicado à obra de Henrik Ibsen, o festival, realizado a cada dois anos na cidade natal do dramaturgo, realiza a premiação como forma de atualizar e difundir a obra de Ibsen.
Em 2024, além do Teatro da Fumaça, foram contemplados coletivos da África do Sul, Cuba, Líbano e Reino Unido. Destaque também para o grupo porto-alegrense Projeto Gompa, vencedor do Ibsen Scope Grant de 2022, que apresentará o espetáculo "Instinto" no Festival.
Conciliando práticas de ensino, criação e pesquisa teatral, o projeto MINERAL IBSEN, revisitará uma das obras mais conhecidas de Ibsen, “Um Inimigo do Povo” para, através dela, abordar questões de forte impacto na contemporaneidade apontadas na peça, como a desinformação, o negacionismo e o impacto da ação humana sobre a natureza. Para trazer tais discussões para a atualidade brasileira, o coletivo irá explorar práticas do repertório do diretor e teatrólogo brasileiro Augusto Boal (1931-2009), abarcados sobre o leque do Teatro do Oprimido, em três cidades mineiras diretamente afetadas pela atuação das mineradoras: Itabirito, Nova Lima e Sabará.
Um dos procedimentos propostos por Boal foi o chamado Teatro Fórum. Tratava-se de uma apresentação teatral que buscava retratar, diante de uma determinada comunidade, conflitos que se aproximavam daqueles que ela enfrentava cotidianamente. Em dado momento da ação cênica, a apresentação era interrompida e, diante do conflito, atores e espectadores debatiam as questões e eram convidados a pensar possíveis soluções. A partir destas discussões a apresentação seguia através das propostas e da dramaturgia desenvolvida simultaneamente.
Os conflitos apresentados por Henrik Ibsen em “Um Inimigo do Povo”, apesar da distância territorial e cronológica daqueles vividos pela população de Minas Gerais afetada pela mineração, possuem enormes semelhanças com a realidade mineira. Se na peça norueguesa o Dr. Stockmann torna-se “inimigo” da população ao denunciar os riscos da contaminação do balneário para a saúde dos banhistas, quando tal população dependia dos recursos daquele balneário, no contexto brasileiro contemporâneo, no momento em que o risco do rompimento das barragens de rejeitos da mineração tornou-se mais concretamente real, instaurou-se, dentro das comunidades diretamente afetadas ou ameaçadas, o conflito entre interromper as atividades extrativistas em proteção às suas próprias vidas e a de seus entes - tendo como consequência a derrocada da principal atividade econômica de sua comunidade - ou, pelo contrário, arriscar a vida mas proteger os empregos e a economia da cidade.
O projeto premiado no Ibsen Scope será desenvolvido pelo Teatro da Fumaça em três etapas ao longo de 2024 e 2025. Na primeira delas, os integrantes participam de seminários teóricos sobre questões relacionadas à mineração em Minas Gerais, à obra de Ibsen e às práticas de Boal.
Na segunda etapa serão realizadas as práticas diretamente com a população de Itabirito, Nova Lima e Sabará, que contarão com a parceria de três coletivos teatrais das cidades. São eles a Sobrilá Cia de Teatro (Sabará), o Grupo Atrás do Pano (Nova Lima) e o Grupo Flor de Maio (Itabirito/MG).
A etapa final do projeto será dedicada ao desenvolvimento propriamente do espetáculo MINERAL IBSEN pelo Teatro da Fumaça em parceria com a Sobrilá Cia. de Teatro. O espetáculo resultará da dramaturgia original criada por meio dos estudos e da experiência prática a partir dos métodos de Augusto Boal.
Sobre Ítallo Vieira
Ítallo Vieira é graduando em Teatro e Cinema na Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, ator, diretor e cineasta. Sua trajetória artística teve início na E.E. Dalva Stela de Queiroz e na igreja Santa Terezinha, de Patrocínio-MG. Integrou a Cia. Máxima de Teatro por oito anos, grupo de teatro patrocinense em atividade.
Dirigiu os curtas-metragens "Com amor, Andrade" (2023), "Desalinho" (2021) e "O que você vê?" (2021). Em Belo Horizonte, colaborou com a Rede Minas de Televisão e o Centro Cultural Galpão Cine Horto. Em 2021, ao lado de Arthur Arvelos, Fernanda Lara e Lara Pires, fundou a LIFA Arte, um coletivo dedicado à produção artística no interior de Minas Gerais. Em 2023, juntamente com Davds Lacerda, fundou a Amanhã Filmes, e com Jean Gorziza e João Santos, o grupo Teatro da Fumaça.
Seu trabalho mais recente é o curta-metragem "Crônicas de Apartamento", fruto de sua parceria com Lara Pires. O filme estreou na Biblioteca Pública Municipal de Patrocínio/MG, em março deste ano, e está disponível gratuitamente no YouTube.
Sobre o teatro da Fumaça
O Teatro da Fumaça é um grupo de teatro criado a partir da reunião de cinco artistas residentes em Belo Horizonte: Domenica Morvillo, Ítallo Vieira, Jean Gorziza, João Santos e Júlia Oliveira. Com diferentes experiências criativas, e todos estudantes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), se uniram para investigar o trânsito do teatro com outras linguagens, saltando as cercas da universidade para pesquisar formas contemporâneas de criar, uma comunicação de amplo alcance e temas de interesse comum relacionados à diversidade, às juventudes e a identidades dissidentes.
Em 2023 o coletivo estreou o experimento audiovisual "Os Benefícios do Tabaco", peça-conferência que aborda o tema da desinformação a partir da indústria do tabaco e o texto "Sobre os Males do Tabaco", do dramaturgo russo Anton Chekhov. Em dezembro do mesmo ano, o grupo apresentou uma leitura dramática do texto “O Mundo Está Em Chamas, o Teatro Também Tem De Estar” do dramaturgo Jean Gorziza. O texto deve agora se tornar espetáculo com previsão de estreia em 2024. Em 2025, outros dois trabalhos serão apresentados: além de MINERAL IBSEN, contemplado com o Ibsen Scope Grant 2024, “Canção de Engate”, aprovado pela Lei Paulo Gustavo.