20 de Abril de 2015 às 11:08

Crocodilo de Campina Verde é exposto pela primeira vez

Centenas de fósseis desta espécie, até então desconhecida da ciência, foram encontrados numa fazenda Três Antas

Reconstituição do esqueleto está em exposição Foto: Luís Adolfo/UFTM

Dando continuidade à programação especial de eventos, o Complexo Cultural e Científico de Peirópolis, da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – CCCP/UFTM apresentou nesta sexta-feira, 17, o Campinasuchus Dinizi, mais conhecido como Crocodilo de Campina Verde.

Os primeiros fósseis deste crocodilo foram descobertos ao acaso em 2009 por Amarildo Martins Queiroz, proprietário da fazenda Três Antas, localizada no município de Campina Verde, no Triângulo Mineiro. As escavações na região continuaram até outubro de 2014. No local, centenas de fósseis desta espécie, até então desconhecida da ciência, foram encontrados. De acordo com o geólogo Luiz Carlos Borges Ribeiro, a quantidade, grau de preservação e o número de fósseis encontrados na região são notáveis. Alguns exemplares traziam esqueletos quase completos, contendo crânio, vértebras, patas e cauda.

Pesquisadores apresentam fósseis encontrados durante as escavações. Foto: Luís Adolfo/UFTM

“A cada nova escavação no Sítio Três Antas novos espécimes são trazidos à luz da ciência numa explosão de descobertas. Além de Campinasuchus há a possibilidade de outra espécie, única no mundo, descoberta em julho de 2014. São atribuídos também a este sítio paleontológico, excepcionais exemplares de peixes, fósseis de dinossauros e ovos de crocodilomorfos”, disse o geólogo. 

Medindo 1,8 metros de comprimento, o Campinasuchus Dinizi foi o crocodilo de menor tamanho entre seus parentes brasileiros conhecidos. A espécie habitava a região durante o período Cretáceo Superior, há cerca de 90 milhões de anos.  Diferente dos jacarés e crocodilos atuais que sempre estão próximos aos rios e lagos, o Crocodilo de Campina Verde vivia essencialmente em terra firme. Ele possuía patas longas e retas e cauda cilíndrica curta, inadequada para nadar. Além disso, a espécie tinha poucas placas ósseas compondo a couraça, o que o tornava leve e ágil.

Outro aspecto interessante sobre a espécie está relacionado à posição dos olhos e narinas. Jacarés possuem narinas e olhos no topo do crânio para respirarem e observarem o ambiente enquanto estão dentro da água. Já os olhos do Campinasuchus Dinizi eram posicionados nas laterais do crânio e as narinas voltadas para frente, tais aspectos reforçam a teoria de que a espécie tinha um estilo de vida terrestre. Os dentes serrilhados e afiados são muito semelhantes aos de dinossauros carnívoros e por isso acredita-se que o animal era um predador voraz.

“Esta é a primeira vez que os fósseis originais do Campinasuchus estão expostos ao público. Além de materiais cranianos muito didáticos, ainda estarão em mostra pública no Complexo Cultural e Científico de Peirópolis uma réplica do esqueleto e uma reconstrução de como era o animal em vida com um nível de detalhe fantástico, muito semelhante ao que deveria ter sido este animal que viveu na região do Triângulo Mineiro há cerca de 90 milhões de anos”, acrescentou o geólogo.

Os trabalhos de campo que proporcionaram os achados dos fósseis de Campinasuchus descritos ocorreram no âmbito de projeto coordenado pelo Prof. Vicente de Paula Antunes Teixeira, com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - Fapemig e Fundação de Ensino e Pesquisa de Uberaba - Funepu. As réplicas do esqueleto e do animal em vida tiveram apoio da Henkel Loctite, fortalecendo a relação das iniciativas com parceria público-privadas no CCCP UFTM.

A arte de recriar as espécies

Rodolfo Nogueira faz a reconstituição da espécie com base nas pesquisas e análise das caractéristicas da espécie (Foto Luís Adolfo/UFTM)

O trabalho de elaboração das ilustrações e esculturas das espécies descobertas pelo CCCP/UFTM é feito pelo paleoartista Rodolfo Nogueira. Graduado em desenho industrial pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP, ele desenvolveu uma metodologia científica para reconstruir animais extintos utilizando conceitos e suportes do design aplicados à paleontologia e arqueologia. O especialista tem ilustrações e esculturas em museus nacionais como o Museu dos Dinossauros de Peirópolis e em países como Argentina, Espanha, Portugal, Estados Unidos e Alemanha.

Réplica produzida pelo paleoartista - Foto: Arquivo - CCCP/UFTM

A produção artística é feita em parceria com os pesquisadores que, ao analisar os fósseis, orientam sobre as características da espécie. De acordo com o especialista, o processo de criação é dividido em quatro etapas: na primeira reúnem-se todas as informações necessárias para imaginar como foi aquele animal, os fósseis são analisados, vários artigos científicos são pesquisados e há discussões com os paleontólogos; em um segundo momento, é feita a ilustração do esqueleto digitalmente em 3D, nesta etapa a forma dos ossos é observada e comparada com animais atuais, tornando possível reconstituir a musculatura; na terceira etapa reconstrói-se a aparência em vida do animal, pele, textura e cores e por fim o ambiente onde ele viveu. O processo é o mesmo para as esculturas reais, primeiramente modelando o animal no computador para depois executar na realidade.

De acordo com o paleoartista a observação dos hábitos e das características de espécies vivas é importante para o processo de criação. A reconstituição do Campinasuchus, por exemplo, foi feita com base em avaliações de outras espécies e esculpida em tamanho real utilizando materiais como resinas e massa para modelar.

“Existem fósseis raríssimos que exibem ainda traços de tecidos moles como pele, penas e órgãos, são excelentes como referência, porém mais comum é observar animais que ainda estão vivos atualmente e que possuam tamanho, hábito, dieta e vivam em ambiente semelhante ao que o animal extinto, alvo de reconstituição viveu. Dessa forma conseguimos traçar padrões de coloração, camuflagem e textura de pele. A mesma análise aplica-se as estruturas moles como os olhos, por exemplo, observamos animais atuais que tenham parentesco ou que tenham hábitos parecidos e aplicamos o mesmo padrão”, explica Rodolfo.