13 de Julho de 2017 às 07:57

Por fraudes na imigração, vistos para os EUA podem se tornar mais restritos para brasileiros, dizem especialistas

Problema são viajantes que dizem ir ao país como turistas e permanecem por tempo irregular

Conhecer os arranha-céus de Nova Iorque, trombar com celebridades internacionais em Los Angeles, se aventurar nos mais divertidos parques de Orlando e pegar uma praia em Miami: o sonho de muitos brasileiros é conhecer os Estados Unidos, mas torná-lo realidade parece estar cada vez mais difícil. E o motivo — mais que o dólar alto em tempos de crise — é a irresponsabilidade de alguns conterrâneos. 

“Hoje, a ordem é para que os vistos sejam cada vez mais restritos para os brasileiros. As fraudes cometidas por alguns acabam se tornando motivo de punição para outros. Muitos dizem que vão ao país a passeio e acabam permanecendo de forma irregular, até pelo desespero que estão passando por conta da situação econômica no País”, explica Daniel Toledo, advogado residente em Miami especialista em negociações internacionais e direito global.

De acordo com Toledo, o Brasil é o terceiro país com cidadãos em situação ilegal nos Estados Unidos — ficando apenas atrás do Canadá, que ocupa o segundo lugar nesse ranking, e do México, que aparece na primeira colocação.

— O dado é preocupante especialmente se você leva em consideração que o nosso País é o único desses três que não possui fronteira direta com os EUA. Quando a pessoa é canadense e atravessa a fronteira com o território americano para morar do outro lado, ela provavelmente decidiu isso de última hora. O brasileiro, não. Ele premeditou, comprou passagem, solicitou visto de turista, levou família, procurou emprego, inventou uma história. É algo mais complexo que o simples cruzamento de uma fronteira.

Em nota enviada ao R7, por outro lado, a assessoria de imprensa da Missão Diplomática dos EUA no Brasil afirma que mais de 50 milhões de visitantes e estudantes internacionais viajaram para os Estados Unidos no ano de 2016.

— A grande maioria, 98,53%, não permaneceu além do tempo permitido por seu visto e saiu dos Estados Unidos, em conformidade com sua condição.

Mudança de planos

Um dos casos de quem queria apenas viajar para os EUA mas teve que mudar os planos é o do designer Vinícius Salles, de 30 anos. Desde o início de 2017, ele se programava para conhecer a Disney em sua primeira viagem internacional. Já tinha garantido passagens de ida e volta, reserva em hotel e até a entrada para alguns parques — tudo por meio de uma agência de turismo. Em maio, se dirigiu até o consulado americano em São Paulo para realizar a entrevista do visto. O documento, entretanto, foi recusado.

— Levei contratos e holerites para mostrar que eu tinha trabalho e família no Brasil. Achei que o fato de eu ter contratado uma empresa para planejar minha viagem daria até mais credibilidade para a obtenção do visto, mas eles não quiseram ver nada disso no consulado. Em junho, tentei o visto mais uma vez, mas recusaram novamente. A única coisa diferente foi que me perguntaram se eu tinha casa própria.

No total, o prejuízo de Salles chegou perto de R$ 3.000. O plano de conhecer a Disney foi, em parte, mantido — só que agora o designer vai para os parques de Tóquio, no Japão.

Na nota enviada ao R7, a Missão Diplomática dos EUA no Brasil esclarece que “quando alguém solicita um visto para os EUA, um funcionário do consulado analisa os fatos do caso e determina se o candidato está qualificado para obter um visto americano com base na legislação e regulamentação de imigração do país. A lei de imigração dos Estados Unidos presume que todos os candidatos a um visto americano de turista ou viagem de negócios têm a intenção de imigrar. Cabe ao candidato o ônus de contradizer tal suposição”.

Critérios rigorosos

Para Ingrid Baracchini, advogada especialista em visto americano e membro da AILA (Associação Americana de Advogados de Imigração), as exigências para a obtenção de visto se tornaram de fato mais rigorosas, principalmente depois da chegada de Donald Trump ao poder. Simplesmente comprovar salário fixo, desta forma, não é mais suficiente para ter o documento facilitado: o viajante deve contar com um rendimento mensal que justifique aquisição de dólares, pagamento de passagem e hotel, além de passeios pelos Estados Unidos por um determinado período.

— Tem também que haver o motivo da viagem, que seja lógico e plausível. As autoridades da imigração analisam ainda se a pessoa tem imposto de renda declarado, dívidas no Brasil, vínculos que sirvam como razão para voltar ao País, algum patrimônio. Eles conferem se o indivíduo tem muitos parentes nos EUA e um emprego no Brasil que faça valer o retorno.

Toledo acredita que os jovens são os que mais se enquadram no perfil de quem tem visto negado. “São pessoas com idade para estar na tentativa de um trabalho novo ou de uma perspectiva de vida diferente”, aponta.

A jornalista Ana Paula Freitas, de 26 anos, é uma das turistas que teve de repensar a viagem após ter o visto para os EUA recusado. Ela pretendia passar dez dias em Nova Iorque, mas, sem o documento, escolheu conhecer a Europa.

— Sempre quis ir para os Estados Unidos, mas era um plano que ia adiando sempre. Agora, vou adiar ainda mais, talvez uns dois ou três anos. No consulado, o agente mal olhou meu passaporte. Perguntou se eu já tinha ido ao país, se ia sozinha, qual a minha profissão, quanto eu ganhava e minha idade. Depois, entregou a carta de recusa. A sorte é que eu não tinha comprado nada referente à viagem antes, porque queria garantir o visto.

Controle constante

Mesmo para quem tem o visto concedido, a fiscalização não para, asseguram os advogados ouvidos pelo R7. Os viajantes têm seus dados e documentos verificados novamente no momento em que pisam nos EUA e, não raro, devem tornar públicas informações em redes sociais para conferência dos agentes de imigração no país, diz Ingrid Baracchini.

— Eles analisam email, redes sociais e Facebook de viajantes que chegam. A qualquer informação suspeita identificada, a imigração tem direito não só de negar o visto, como também de negar a entrada para quem tem visto válido.

A Missão Diplomática dos EUA no Brasil informa que trabalha “em estreita colaboração com parceiros de diversos órgãos para analisar continuamente os portadores de vistos depois de receberem o visto. Temos autoridade ampla e flexível para revogar vistos e usamos essa autoridade de diversas formas para proteger as nossas fronteiras”. O objetivo, explica o consulado, é priorizar a segurança nacional.

As condições rigorosas, entretanto, não devem ser motivo desânimo para quem tem boas intenções, afirma a advogada da AILA. O importante é não incorrer em erros básicos na hora de preencher o formulário do visto ou omitir informações.

— O brasileiro, às vezes, acha que pode preencher os dados de qualquer jeito e, na hora da entrevista do visto, vai ter a chance explicar toda a viagem com calma. Mas são centenas de solicitações a cada dia, os agentes não têm como ouvir a história de cada um, e é para isso que o formulário existe. Tem que colocar o quanto ganha, se tem renda extra, o motivo da viagem, o que existe no nome da pessoa, número do voo, quem vai junto.

Daniel Toledo completa que esconder informações aparentemente comprometedoras também não funciona: "Muitas pessoas omitem informações quando perguntam se elas conhecem alguém que mora nos EUA. Dizem que não, com medo de que o consulado pense que o conhecido já está procurando emprego, facilitando casa, etc. Mentir, nesse sentido, é um erro. Também acontece muito de a pessoa solicitar o visto e ter o visto negado. Aí, quando esse indivíduo decide pedir novamente depois de um tempo, o consulado pergunta se ele já teve o documento recusado, e ele responde que não. Mas o órgão, obviamente, sabe do histórico", aponta. 

A Missão Diplomática dos EUA no Brasil, por sua vez, reforça que o Departamento de Estado continua empenhado em facilitar viagens legítimas de pessoas qualificadas. Leia a íntegra da nota enviada pelo órgão abaixo:

Segurança nacional é a nossa prioridade máxima quando atendemos às solicitações de vistos, e todo viajante em potencial para os Estados Unidos passa por uma extensa triagem de segurança. Trabalhamos constantemente para encontrar mecanismos que possam aperfeiçoar nossos processos de triagem e para apoiar viagens e imigrações legítimas para os Estados Unidos protegendo, ao mesmo tempo, os cidadãos americanos. O Departamento de Estado continua empenhado em facilitar viagens legítimas de pessoas qualificadas. Reconhecemos, ao mesmo tempo, que cada decisão sobre visto é uma decisão de segurança nacional e precisamos nos certificar de que cada candidato seja apto para obter um visto.

O Departamento de Segurança Interna (DHS) é responsável pela saída e pela entrada de viajantes individuais. Para mais informações sobre autorização de permanência além do tempo permitido, consulte o Departamento de Segurança Interna. Mais de 50 milhões de visitantes e estudantes internacionais viajaram para os Estados Unidos no ano fiscal de 2016, contribuindo enormemente para a economia do país. A grande maioria, 98,53 %, não permaneceu além do tempo permitido por seu visto e saiu dos Estados Unidos em conformidade com sua condição.

Quando alguém solicita um visto para os EUA, um funcionário do consulado analisa os fatos do caso e determina se o candidato está qualificado para obter um visto americano com base na legislação e regulamentação de imigração do país.  A lei de imigração dos Estados Unidos presume que todos os candidatos a um visto americano de turista ou viagem de negócios têm a intenção de imigrar. Cabe ao candidato o ônus de contradizer tal suposição.

Proteger a integridade dos vistos dos EUA é prioridade máxima do governo americano. Nossa tolerância é zero com conduta ilegal. O Departamento de Estado considera com seriedade todas as alegações de fraude de visto e se esforça para garantir a integridade do processo de vistos nos Estados Unidos.  O Departamento mantém programas extensos para combater vigorosamente a fraude de vistos e investiga todas as alegações de tal atividade. Trabalhamos também em estreita colaboração com parceiros de diversos órgãos para analisar continuamente os portadores de vistos depois de receberem o visto. Temos autoridade ampla e flexível para revogar vistos e usamos essa autoridade de diversas formas para proteger as nossas fronteiras.


Comentários

Termos de uso:

Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do Patrocínio Online. É vedada a inserção de comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros. O Patrocínio Online poderá remover, sem prévia notificação, comentários postados que não respeitem os critérios impostos ou que estejam fora do tema da matéria comentada. É livre a manifestação do pensamento, mas deve ter responsabilidade!